Oito pesquisadores americanos publicaram um novo estudo mostrando que o aumento na poluição do ar resulta diretamente em aumento nos índices de mortalidade causada pela Covid-19. O trabalho, divulgado em 11 de setembro, reforça conclusões pioneiras de pesquisadores italianos e chineses durante o pico da pandemia no norte da Itália e na China, mostrando que a exposição contínua à poluição do ar poderia se constituir em risco de sintomas graves em caso de infecção pela Covid-19 e consequente mortalidade por Síndrome Aguda Respiratória.
O estudo foi publicado pela plataforma IOP Science e liderado pelo pesquisador Mike Petroni, do Centro de Medicina Ambiental da Universidade Estadual de Nova York (SUNY – State University of New York). O fundo de pesquisas Discovery Challenge Fund, da SUNY, foi um dos principais financiadores do estudo. A IOP Science prioriza e divulga mundialmente trabalhos científicos de ponta envolvendo tecnologias inovadoras.
Efeitos da poluição
As conclusões do novo estudo apontam para duas possibilidades. Na primeira, a poluição provoca danos diretamente nos cílios, expondo o sistema respiratório a agentes infecciosos. Presentes nas células que revestem as vias aéreas, os cílios impelem o muco que recobre essas vias, para ser expelido por tosse ou levado à boca para ser engolido ou expelido. O muco captura micro-organismos infecciosos e partículas, evitando que cheguem aos pulmões.
Na segunda hipótese, o impacto é indireto, causado pelo agravamento de doenças cardiorrespiratórias preexistentes, o que reduz a imunidade e acelera dificuldades causadas pela Covid-19. Para o professor de patologia Paulo Saldiva, da Faculdade de Medicina da USP, o estudo ajuda a consolidar o conceito de que a exposição crônica a poluentes atmosféricos reduz a eficiência dos mecanismos de defesa do pulmão: “Esses mecanismos combatem os agentes infecciosos inalados. Há evidências suficientes na literatura médica mostrando que os pulmões de indivíduos expostos à poluição do ar desenvolvem uma inflamação crônica que se manifesta produzindo mudanças na estrutura do epitélio respiratório. Isto também prejudica a defesa imune, que funciona como uma segunda barreira contra micro-organismos patogênicos.”
O professor Saldiva é membro do painel de especialistas que estabeleceu os padrões de qualidade do ar adotados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e integrante do grupo que definiu o potencial cancerígeno da poluição atmosférica para a Agência Internacional do Câncer.
Poluentes tóxicos
Além de reforçar a ligação entre poluição do ar e mortalidade por Covid-19 identificada anteriormente, o estudo analisa o impacto na mortalidade por poluentes classificados como tóxicos – os chamados HAPs (Hazardous Air Pollutants). HAPs são emitidos por diversas fontes de poluição, sendo particularmente relevante a emissão por veículos automotores em zonas urbanas densamente povoadas, segundo os pesquisadores. Entre os poluentes considerados HAPs estão as partículas de diesel, aldeídos como acroleina, acetaldeído e formaldeído, e hidrocarbonetos aromáticos como benzeno e naftaleno.
Momento decisivo
O novo estudo chega com o governo pressionado por entidades que representam o setor automotivo, que desejam postergar a implantação de novas medidas para diminuir as emissões veiculares. Desde o início do ano, a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) e a Associação Brasileira de Empresas Importadoras e Fabricantes de Veículos Automotores (Abeifa) vêm propondo a postergação por três anos das novas etapas do Proconve, o Programa de Controle da Poluição do Ar por Veículos Automotores. Definidas em 2018, a previsão para a entrada em vigor das novas etapas é janeiro de 2022.
Montadoras e importadoras de veículos alegam dificuldades de mercado provocadas pela queda de vendas durante a pandemia do coronavírus. A pandemia provocou um período de três mêses de paralisação das atividades da indústria automobilística e dados das próprias entidades já vêm apontando uma recuperação nas vendas de veículos.
NA WEB
Estudo completo pubicado na plataforma IOP Science:
https://iopscience.iop.org/article/10.1088/1748-9326/abaf86#acknowledgements