A Constituição, inacabada e remendada

Por Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves 13/05/2013

Noticia-se a existência, no Congresso Nacional, de nada menos que 108 Propostas de Emenda Constitucional (PEC) engavetadas. Diante da falta de condições políticas, jurídicas ou de interesse, deputados e senadores remeteram os projetos para o buraco negro, sem aprovar nem rejeitar, e ninguém mais fala deles, a exemplo do que ocorreu com os mais de 3 mil vetos governamentais recentemente discutidos e hoje novamente adormecidos. Mas seus autores já faturaram prestigio político, ainda que efêmero, na época da apresentação. Parece que tais PECs foram elaboradas exclusivamente para atender aos interesses demagógicos dos signatários. Enquanto perdem tempo com propostas inviáveis, os srs. congressistas negligenciam em relação à regulamentação da Carta.

Promulgada e em vigor a partir de 5 de outubro de 1988, a Constituição ainda carece de 142 regulamentações, sendo 25 por meio de leis complementares e 117 por leis ordinárias. Empregados domésticos, aposentados, índios e outros segmentos da sociedade não vêem implantados os benefícios estabelecidos pela Constituição porque faltam as leis que devem detalhar como fazer cada coisa. Dessa forma, mesmo com toda a boa vontade dos constituintes, que produziram uma Carta massuda, detalhista, seu texto torna-se inócuo, pois não há como aplicá-lo.

Essas figuras que a cada quatro anos batem em nossa porta pedindo votos têm o dever de terminar a obra constitucional. Mas em vez disso, preferem apresentar novas alterações. O texto colocado em vigor em 88 já recebeu 72 emendas ao longo desses quase 25 anos de vigor. Um exagero se comparado à Constituição dos Estados Unidos da América que, em vigor desde 1787, foi emendada apenas 28 vezes. É por isso que governantes daquele país, em momentos importantes, exaltam o texto constitucional e a perenidade das instituições por ele reguladas há mais de 200 anos.

O Brasil viveu a maior parte de sua existência sob regime autoritário. A primeira Constituição da República, embora produzida legalmente, amparou as oligarquias, o coronelismo e o voto de cabresto. A de 1934, também legalista, durou apenas até 1937, quando Getulio Vargas deu o golpe do Estado Novo, que foi até 1945. A de 1946, de bases liberais, foi mutilada em 1964 pelos atos institucionais e substituída em 67 pelo texto dos militares, aprovado no Congresso combalido pelas cassações de mandatos. A atual Constituição é a mais de mais longo tempo dentro do regime democrático, mas, para atender à proposta dos seus elaboradores, precisa dos complementos.

A Nação espera que os quase 600 congressistas - 513 deputados e 81 senadores - atentem para seu compromisso para com o presente e o futuro e cuidem, sem demora, da conclusão da tarefa constitucional. Sem isso a democracia brasileira nunca se consolidará...

Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves - dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo)
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